Um Amor em Paris – um pretexto para falar de parceria.

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Era sábado a noite. As ruas e bares de BH agitados pelo calor e pela curtição de mais um fim de semana. Brisa me aguardava para irmos ver uma exposição ou um filme. Pelo tardar das horas a exposição tinha acabado, restava um filme que não tínhamos idéia de qual estava em cartaz. Vimos, lemos e ficamos entre três. Eliminado um, optamos pelo filme AMOR EM PARIS.

O filme dizia respeito a temática que vou tratar no curso vivencial que abri as inscrições, de forma que o filme me serve de pretexto para falar da temática que pretendo conversar, versar e ser versado ao longo do curso- parcerias. Mas, antes de chegar a elas tenho que perguntar:
O amor supera uma traição? O amor termina depois de uma traição? É possível perdoar uma traição? Existe traição? Uma traição é algo a ser compartilhado com o parceiro(a) ou algo a ser segredado no mais intimo de si mesma(o)?

O filme de uma forma bem singela, sem ter essas ocupações, acaba por responder a essas perguntas. Mais do que responder a isso, o filme explora os relacionamentos, as parcerias onde elas agarram, se desgastam, se machucam, se ferem.

A nossa personagem (Isabelle) esta lá, ao lado do marido (Xavier), com ele. Eles se amam, mas há coisas num e no outro que eles não gostam. O gostar é diferente de amar e Martin Luther King é quem nos ensina isso de uma forma muito bonita. Prega o pastor americano que Jesus nos ensina amar os inimigos e não a gostar dos inimigos, porque não tem como gostar do policial racista que solta os cachorros em cima de você e da sua esposa, não tem como gostar da discriminação e do discriminador, mas é possível amá-los. Na convivência, no partilhar a vida a dois com um outro(a), dividindo tempo, espaço em todos os níveis e muitas dimensões tem coisas que não gostamos, mas o amor permanece, continua. Pelo menos até o momento no qual o amor também não basta. E esse momento existe, embora ninguém nos alerte, nem mesmo a pessoa que amamos. Precisamos falar e contar para todo mundo que o amor não basta, que por amor as pessoas se perdem, matam, suicidam, se desesperam. Também por amor as pessoas se constroem, se reconstroem, se capacitam, se emancipam. Mas, o amor sem o outro não basta. E tem vezes que o amor chega tarde, ou cedo demais. Ahhh esse amor!!

Há um momento na relação, em que como disse uma partilhante certa vez: “a tolerância fica insuportável.” Tudo que o outro faz ganha a dimensão de agressão, de ataque. Aqueles pequenos desagrados ganham força, amplitude, tamanho, dimensão e eclipsa o amor em magoas, ressentimentos, dores, rancores, que fica difícil visualizá-lo de novo. É aqui que muitos perdem o outro, perdem a si mesmo, se machucam, se ofendem, caminham para uma direção cujo retorno fica mais difícil. É clichê dizer que nesse momento damos abertura para outras pessoas. E uma pessoa que chega nos apresentando novos gostos que esquecemos, novas alegrias que já não tínhamos dá um colorido para nosso ser que vai ocupando um espaço não preenchido, esvaziado. A partir disso tenho me feito a pergunta: é o amor um hábito? Uma rotina? Uma ocupação? Por vezes, parece que sim.



Retomando o filme, vemos o amor um pelo outro. Vemos também as tensões entre o gostar de um e outro. Vemos como o peso da rotina a acaba oprimindo, no mesmo sentido que a forma dele resolver as coisas, ou melhor, não resolvê-las, a cansa. E tudo caminha para o marasmo infinito até que um jovem chega pedindo fogo. Talvez mais levando fogo do que pedindo e isso a acende. Dá a ela uma sobre vida que ela tinha perdido, abandonado, deixado de lado, por que? Quem pediu isso a ela? Por que fazemos isso? Ela não sabe, a maioria de nós nem pensa nisso, em como que fomos abrindo espaço, dando espaço, cedendo espaço e tempo em nós para o outro(a) e de repente não temos mais a nós mesmos.

Nessa perda amplia-se a sensação de vazio, de dor, de angustia, de ausência de algo que era e não se tem mais. Esse quadro de insatisfação moderada ou profunda é tratado hoje como depressão, com base em anti-depressivos, com remédios para dormir, para controlar a ansiedade de um gosto abandonado, esquecido. Diante desse cenário ataca-se o outro(a) ininterruptamente. Acusa-se e ressente-se com o parceiro(a) por essa perda de si mesmo. Os conflitos ficam ainda maiores, porque reaver espaço ocupado por terceiros é briga inglória. Sabe terreno abandonado que o outro construiu? Pode ser barracão ou mansão, não importa, o outro(a) acha-se dono, com ou sem razão. Esse desalojar cria tensão, briga, insatisfação, mas a reflexão é: de quem é o espaço? Onde foi construído esse espaço?


Há espaços que são do outro, há espaços que são nossos, há espaços que são conjuntos. Todo o desgosto parece vir da perda desse referencial. Alguns casais só têm o dele. Outros só têm o dela. Outros perderam o nosso, isto é, aquilo que é gostoso para os dois. Mas, insisto, não sabemos disso antes de desgostarmos tanto do outro(a) que a convivência se torne insuportável. Parece que há uma interdição em falar desses espaços, desse tempo, desses gostos. Parece que há uma necessidade em cada um ficar eternamente cedendo e suportando, suportando e cedendo até que uma parte abandonada do próprio ser, grite pedindo ar, refresco, clareza, lucidez, prazer.


Essa parte gritou na nossa personagem e ela tirou dois dias para ir a Paris procurar o rapaz que conheceu na festa. O encontra, mas não acontece nada. Acontece com um terceiro vindo de um país escandinavo para uma palestra. Todavia, o marido desconfia e vai a Paris e indo, esperamos que ao vê-la saindo com outro do hotel vai fazer um barraco. Depois ao segui-la pelo metro, esperamos o mesmo, mas ele vai até o Louvre, pára diante de uma tela que recorda a sua esposa. Encontra o seu filho razão de des-gosto e tensão entre ele e a esposa, porque ele gostaria que o rapaz estivesse fazendo agronomia e o filho escolhe fazer acrobacia. E ao assistir a apresentação do filho, um dos pontos mais sensíveis do filme, porque o rapaz brinca com o ar, com o equilíbrio, com o tempo, com a leveza, ele se emociona. Conversa com o filho que ele ama, mas não gosta da escolha, ou não gostava e volta para casa.

Voltando, ele teme que ela não retorne mais, que ela tenha se apaixonado por outro. Ele teme perdê-la. Ele confidencia com um conhecido que a viu com outro e o conhecido diz que ela vai retornar porque eles se amam. E o mesmo revela o caso de amor que ela descobriu dele e também ficou perturbada, abalada, esperando o retorno dele. Ela volta. Eles não falam do assunto. Ele não toca nisso. Até que num momento depois de novamente felizes, ela descobre que ele a viu, que ele sabe o que houve. Ela também nada diz, apenas o ama mais. Na verdade, passa a gostar mais dele.

O amor precisa do gostar. Não é que ele seja um hábito, ou um costume, mas ele é um cultivar. O amor precisa ser cultivado e ele o é por gestos, por falas, por ações, por silêncios, por lembranças, recordações, projetos. O amor é cultivado junto. Ele amplia e cresce sozinho, mas a sua significação se dá no encontro com outro.

Luis Soares um amigo espiritual nos contava lá no início do ano 2000 que amor e alguns outros atributos que encaramos como sendo sentimentos são seres. O amor na concepção dele seria um ser, assim como a Harmonia, a Gentileza, a Honra e todos os outros. Sendo o amor um ser a gente precisa aprender a cultivá-lo, a engendrá-lo, a acolhê-lo. E parece que isso esta no gostar, no querer bem, no tratar bem e veja que gostar, querer bem e tratar bem nada tem a ver com poupar o outro, tem a ver com saber que o outro esta com você e você com ele, porque mesmo não gostando de algumas coisas há amor. E é somente nesse ponto que o amor basta. O amor sem cuidado com o outro, sem perder o receio de quebrar o outro não basta, não supre, é esvaziado pelo desgostar.




Finalizando, o ponto mais interessante do filme é a maturidade desse cuidado. Como que um e outro se poupam de revelar que sabe que traiu e foi traído. Como que de forma silenciosa, eles se calam e se gostam mais. Já outros casais necessitam que isso fique aclarado, colocado, posto. Parece que não tem uma fórmula para isso e nem para nada nessa vida, a não ser o respeitar o próprio gostar e a partir de uma escolha conjunta ampliar o respeito ao gostar do outro e juntos acolher e cultivar o amor. Um amor em Paris, em Bh, em nós mesmos, com o outro, com o mundo. Um amor. 


Essa temática do amor, das parcerias será apresentado por nós num curso vivencial em 4 encontros aqui em Bh. Todos os que se interessarem, sintam-se convidados para realizar as inscrições. 


2 Comments

  1. 13 de outubro de 2014

    Ola Kel!! Que gostoso. É Juliene, se lembra de mim?

    Tem como vc falar da dinâmica do curso?
    beijinhos

  2. 15 de outubro de 2014

    Oi querida, recordo sim. Como vc está?

    Acho que no post que sucede a esse falei um pouco da dinâmica do curso.

    Serão 4 encontros teórico-práticos-vivenciais. Envio um pequeno texto, conversamos sobre ele e em seguida realizamos uma prática bioenergética, meditativa. O objetivo é nos conectarmos com nosso feminino, escutá-lo sem que para que ele seja escutado tenhamos que nos machucar e machucar a outras pessoas.
    bjs para vc e vamos nos falando.

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