MÃOS: a CORagem do toque
Os ocultistas costumavam dizer que: ” as mãos são a parte visível do cérebro.”Que bela constatação. Já viram como algumas pessoas falam mais rápido com as mãos do que com a boca? E outras que não sabem onde colocar as mãos enquanto falam, ou escutam? É que nem sempre se consegue perceber a co-relação entre mãos e cérebro e quanto a isso me recordo os mudras. Os monges budistas recorrem aos mudras para dar a mente o mesmo apaziguamento. É uma relação profunda, por vezes pouco investigada.
Tudo isso me faz recordar os momentos nos quais me separei ou terminei relacionamentos. Quando da minha separação ficava me perguntando: como é que se toca o corpo de uma outra mulher? Não eram as mãos que desaprendiam os caminhos e sim o cérebro, a mente. Mais recentemente, fico tentando encontrar um lugar para as minhas mãos, onde colocá-las? O que fazer com elas? Elas e eu nos perdemos nos emaranhados das muitas possibilidades, mas escrevo para falar não das minhas mãos, mas das mãos de todos nós. Acaricio as minhas, porque a agonia dela nesse momento está mais perto, mais presente, mas falo de todas as mãos do mundo, pelo menos tento.
Rememoro isso por muitos motivos, primeiro, porque meditando sobre a importância das mãos vi que essa parte do corpo, mais do que qualquer outra é relacional. Depois, e a partir disso, recordei uma amiga nos tempos do mestrado, que me leu um poema do Drummond. Leu o poema, mas a parte que ela destacou foi:
Nesse dia específico acho que ela trocou o tema da dissertação dela, ela fez uma tese sobre as mãos dadas. E prestei tanta atenção, porque uma ou duas semanas antes, saindo com uma pessoa que eu gosto muito, ela tentou me dar as mãos, mas as minhas fugiram, correram, não corresponderam. O incomodo daquelas mãos nas minhas, no meio da rua, me desarticularam. O que causava espécie é que continuamos o encontro, mas acho que depois disso nunca mais nos vimos. O inusitado foi que eu a beijei na boca, nós transamos, mas não nos demos as mãos na rua, na praça, em público. Surreal a primeira vista. Monstruoso numa segunda visada, mas lhes convido para uma terceira perspectiva, preciso me redimir.
I
Mas, não quero falar nem da coragem e nem do amor, eu quero falar das mãos. São as mãos o símbolo desse elo e muito mais. E fico a vontade para falar disso, porque minhas mãos são escorregadias, fugiram de muitos toques, de muitos enlaces. Minhas mãos-mente não me permitiram muitos enlaces e voltas.
Na linha de Nélson R essa é a traição imperdoável. É aquela que não é por sexo, por deleite, por curiosidade. É aquela que se deixa cravar de balas a pensar na possibilidade de ficar sem o ser amado. E, são, invariavelmente, esses que morrem nas crônicas jornalisticas. Os outros casais fogem, correm, pulam a janela, soltam os braços, justificam-se por estar de meia ou com o sofá velho.
Mas, finalizando trago tudo isso, porque é possível estar com muitas mulheres, as mulheres estar com muitos homens, muitas amigas, colegas falam de mãos cheia de homens e mulheres com os quais já tiveram uma noite de transa, ou meses de relacionamento; mas para quantos e quantas deram a mão…. são poucas, poucos, raros.
O dar as mãos tem uma liturgia que deveria valer mais do que troca de alianças. Relembrando alguns relacionamentos… dei as mãos para poucas mulheres. São raras as que podem dizer: “caminhei de mãos dadas com ele.” E hoje, cem anos depois acho isso bonito. Se somente o beijo é a verdadeira posse, como dizia Nélson. Somente as mãos dadas cria o vinculo, a coragem do comprometimento. Todas as mulheres para quem dei as mãos e elas me deram as mãos tivemos um laço, um vínculo, uma cumplicidade, até mesmo aquela que quis preservar e se chateou comigo como se eu a escondesse.
Quando amigas, amigos, conhecidos, desconhecidos, inimigos vierem me contar as suas histórias de amor, minha pergunta será, não quantas vezes se casou, mas com quem caminhou de mãos dadas? São esses os relacionamentos mais significativos, ilustrativos. Eles dão testemunho de uma coragem, de um assumir silencioso, mas mutuo. As mãos dadas encerram um pacto, uma relação que nem o esquecimento quebra.